sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

Fomos poesia

Um dia te mostrei
os meus versos
e tu disseste que os leria
ao som de Chico
(perguntei se era o César
tu respondeste: é o Buarque)
falamos também de Manoel de Barros
e Mário Quintana
concordamos que nossa memória
é um museu aberto à visitação
e tu lembraste de algo que atravessara tua história...

Confissão!

"Acho-me relativamente feliz
Porque nada de exterior me acontece...
Mas,
Em mim, na minha alma,
Pressinto que vou ter um terremoto!"

A saudade costuma deixar terra arrasada
mas cada pequena lembrança
dormirá feito semente 
e sempre haverá um dia
em que ela germinará 
e eu lembrarei com carinho da gente
do futuro que nos teus olhos eu via
e de quando compartilhamos
vivemos
e fomos
poesia!

quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Até a lua nova sorria

É fascinante o brilho
que existe no teu falar
que elegantemente sorri 
enquanto me contas
as tuas memórias,
a tua história
que adoro ouvir.
E instigante 
é o brilho 
que existe no teu olhar
um mar castanho claro 
paisagem espelhada em meus olhos
onde eu sinto vontade de mergulhar...
Se antes a página em branco
um dia chegou a me assustar 
acaso agora tome um susto 
sinto-me como Ferreira Gullar, 
que ao espantar-se 
chamou aquilo de poesia,
imagina se ele tivesse o privilégio
de te ouvir como eu te ouvia
na mesa do bar
sob a luz do luar
e lá fora
até a lua nova 
sorria.

terça-feira, 30 de novembro de 2021

Paralelos

Alguns quilômetros nos separam
ao mesmo tempo
que apenas um centímetro
nos difere 
se por acaso
você sorrisse para mim
leãozinho
o pôr-do-sol seria de todas as cores:
azul vermelho laranja e amarelo
nossos sorrisos 
no horizonte
se encontrariam 
e seriam como o mar
ao espelhar o céu...

Paralelos. 

quinta-feira, 25 de novembro de 2021

A poesia não adormece (continuação)

 A poesia não adormece
e o tempo se recusa
a envelhecer
então a poesia segue
acordada 
mesmo quando nada diz
e o tempo distraído 
nem percebe
que a poesia está sempre
por um triz.


O tempo não envelhece

O tempo não envelhece 
e a poesia não dorme
então o tempo passa:
alvorada, 
pôr-do-sol,
anoitecer
e a poesia
acordada
continua 
a acontecer.


terça-feira, 14 de setembro de 2021

Camuflada entre rosas

 A tarde verde azul
testemunhou 
o dia
em que tu
numa paleta 
vermelha
entre rosas
se camuflou.

O dia
foi quase tão bonito
quanto o sorriso
que do teu rosto
desabrochou.










quarta-feira, 25 de agosto de 2021

Poema sobre o nada ou Tinha um prédio no meio do caminho

O prédio atrapalha a minha visão
a vontade de querer enxergar o mundo de azul
de assistir às cinco e quarenta e cinco da manhã
o pôr-do-sol ao contrário
cinza alaranjado rosa amarelo 
em contraste à feia arquitetura
que transforma pedra sem vida
em colunas cimentadas que atrapalham a minha vista.

Eu quero enxergar
bisbilhotar
debaixo das pedras 
que não têm, 
mas que abrigam:
vida.

Eu quero espionar
o verde musgo das briófitas
o desabrochar das borboletas
o cochichar dos bem-te-vis
a palavra voando fora da asa
o milagrar de flores

Eu quero atirar pedras no céu 
e acertar algum homem de pecado
que dizem ser santo

mas há um prédio no meio do caminho
arranhando o céu 
sem carinho
como um amontoado de pedras desperdiçadas
que sequer abrigam musgo

no meio do caminho há um prédio
que atrapalha minha visão
que tem nome de cidade europeia 
ou de um homem branco qualquer
que minhas retinas fatigadas
traduzem livremente:
Ed. Dr. Zé Ninguém 

Nunca esquecerei desse acontecimento...

Manoel de Barros me entenderia 
Carlos Drummond de Andrade também.

terça-feira, 17 de agosto de 2021

Fica

Para Raíza Carvalho

Saudade é coisa que fica
como o cheiro 
do chamego
da memória
do livro
da história que passou
mas que ficou.

Saudade é coisa que grita
como uma voz sufocada
que mesmo abafada
consegue ser ouvida.

Saudade é querer voltar
quando ela é ida
é norte. 

Saudade é como o teu cheiro 
que fica
e fica forte.




Desperdício de palavras

O teu silêncio 
fala comigo
mais do que qualquer palavra

nós não existimos mais
um para o outro
não somos mais nada
daquilo tudo
que quase chegou a ser

o teu silêncio fala
sem desperdiçar nenhuma palavra

será que dói morrer?



"Echo of silence"

domingo, 15 de agosto de 2021

To Khatia Buniatišvili

This morning
is Mediterranean blue 
and the Georgian pianist
playing Tchaikovsky
and the morning breeze
smelling like nostalgia
coffee and bread 
make me remember
what (one day) 
I used to call
poetry.




quarta-feira, 21 de julho de 2021

Para Khatia Buniatišvili

A manhã 
azul mediterrâneo
a pianista georgiana 
tocando Tchaikovsky
o cheiro da manhã
- de saudade,
pão e café
me fazem relembrar
o que um dia
acostumei chamar
poesia.



sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

Ida

Às vezes eu paro e penso:
como é engraçada a vida
a gente morre de vontade
de voltar 
(no tempo)
esquecendo
que o tempo só conhece 
passagem de ida.




terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Poema para o abraço na Praça João Lisboa

Tem abraço que é poesia
Tem abraço que é aconchego 
Tem abraço que é moradia 
Tem abraço que é desassossego
Tem abraço que é eterno
(Por segundos)
Tem abraço que é etéreo
Tem abraço que cabe o mundo
Tem abraço que é fogo
Que arde e a gente vê
Tem abraço que é desafogo
Tem abraço que faz reviver
Tem abraço onde a gente se encontra 
Tem abraço em que a gente se perde
Tem abraço que a gente remonta
Tem abraço que a gente nunca se esquece 
Tem abraço que é asa 
(Faz o pensamento voar)
Tem abraço que é casa 
Onde a gente deseja pra sempre morar.

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Estalagmite

Quando tu choves em mim
eu solidifico
minha língua paralisa
e dentro de ti eu fico
-fixo
entre tuas pernas
como estalagmite 
no chão de uma caverna...

Quando tua placa tectônica
vai de encontro a minha  
a angústia platônica
transforma-se em correnteza 
que vai me levando feito rio
ate às (suas) profundezas,

E quando aparento estar sem ar
eu te sonho de novo
e a água que me puxa
desta vez é salgada
como as ondas do mar
e o suor do teu corpo,

Mas nem em frente ao mar
eu hei de sede morrer,
pois bebo da tua saliva 
me alimento de tua seiva 
e banho na tua fonte 
que me faz reviver.

 
























Ilustra by @alphachanneling


quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

Jeito de solidão

 O grito da saudade ecoa
 no silencio
e o peito tenta gritar
abafado
o teu nome
mas é sufocado
pela angústia que me consome,

O grito da saudade ecoa
no silêncio
e o coração tenta ouvir
o teu nome
em vão
o dia indiferente já vai
indo embora
sem alarde
são cinco e quarenta e cinco da tarde
é mais um por do sol
com jeito de solidão.




segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

Eu e Você

Quase tudo já foi dito
mas há sempre algo
a se dizer
pois acostumar-se
à ausência
(em silêncio)
é uma das piores formas
de sofrer.

E de sofrer
o poeta entende
principalmente
se for de saudade
pois aquilo que se sente
é a nossa mais íntima verdade...

E a verdade é que quase tudo
já foi dito
mas há sempre algo mais
a se dizer:
se o amor é infinito
nós dois seremos sempre
eu e você.